Ma vie en rose

De frente, de lado, de costas. En France.


terça-feira, junho 17, 2008

Mi casa no es su casa

Debaixo de uma chuva torrencial, cheguei em frente à associação que faz as traduções juramentadas que, de quando em vez, eu preciso. Com fome, mal-humorada e molhada, me deparei com a entidade fechada e um aviso que eles reabririam em meia hora. “Meia hora eu posso esperar aqui bem quietinha em baixo desse toldo”, pensei me encolhendo em um cantinho enquanto algo dizia “vai pra casa e volta depois”. Mas, bicho teimoso, resolvi ficar. Porque nessas situações eu sempre penso: “Sou macha, posso agüentar”. Posso agüentar tomar meia hora de chuva na lata, sem ter comido nada até aquela hora e com o saco cheio batendo todos os recordes, depois da quarta semana consecutiva de chuva.
A alguns metros de mim, avistei um cara que, pela pinta de estrangeiro, também devia aguardar o horário de reabertura. Ele me olhou e eu fiz que nem percebi. Pensei: "fica aí bem na tua e faz de conta que eu não existo".

E então que meu desejo não foi realizado e a criatura resolveu se aproximar e puxar assunto. Em francês.

- Você sabe a que horas abre a associação? (e tipo, um cartaz enorme na porta informava os horários de funcionamento).
- Em quinze minutos – clara, educada e sintética. Bastou, né? Não, ele continuou as tentativas de conversa:
- Eu moro longe, não posso esperar muito tempo.

Tipassim, e eu com isso. Amazônia sendo desmatada. O petróleo acabando. O Brasil dando fiasco nas Eliminatórias da Copa do Mundo. Tenho muitos problemas também. E vê se eu fui reclamar com ele.

Mudou de assunto:
- Você viu que tem outra entrada? Eh ao lado, você tentou entrar por ali?

Mas, ah, meu saco, hein! Não adiantou nem fazer cara de antipática.

- Não tentei porque na verdade preciso pegar um documento com a recepcionista, aqui mesmo nessa porta.
- Documento de moradia?
- Não, de tradução.
- Porque que eu preciso de um documento de moradia.

Faço cara de não sei e não quero saber. Mas ele queria:

- Você é romena?
- Não, brasileira.
- Brasileira? (toda vez que eu digo que sou brasileira, é batata: o interlocutor SEMPRE repete a afirmação, sei lá porque whatahell).
- Eu sou angolano – me diz, agora em português, mas, de novo, sem eu perguntar nada. E continua:
- Você é casada?
- Não, mas tenho namorado e moro com ele. (dizer que eu tenho namorado e que eu moro com ele é sempre uma boa estratégia pra afastar os cara de pau)
- Porque eu sou sozinho. Não tenho mulher, não tenho filhos. Sou muito sozinho.

E nem eu tenho mulher e filhos! E ele continua:

- Você trabalha?
- Não, estudo.
- Por que você não trabalha?
- Porque não tenho a carte de séjour, não posso trabalhar legalmente.
- Mas entao por que você não engravida? Engravida que isso vai te dar o direito de ganhar a carte de séjour, vai poder ficar aqui e vai poder trabalhar.

Ok, me respondam se pode piorar.

- Você me passa seu número de celular? - ele acabara de me ver consultando a hora no telefone.

E a criatura chegou em um ponto que eu NUNCA consigo me desvencilhar. Por que os homens têm a ousadia de me perguntar isso mesmo quando eles percebem que eu quero mandá-los para o piiiiiiiiii e eu, uma macha, não tenho a coragem de dizer não? Par contre, como sou muito espertinha, pensei: se eu anotar o celular dele primeiro eu digo que vou ligar pra ele e zé fini. Cierto? Oh-oh, não cierto.

- Deixa que eu anoto o teu número. Qual é? Ok, anotado. (Ufa!)
- Agora você me passa o seu número.
- Mas eu já anotei o teu, deixa que eu te ligo - eu minto.
- Não, quero o seu também. Me passa!

Ai, né? Não restou saída e, no tom que ele me falou, tive um pouco de medo, e uma pontinha de esperança que tudo acabasse ali.

NOT.

- Eu vou ligar pra você no sábado, você me busca na estação de trem e você me convida pra ir até a sua casa - ele ordena.

Ai, meu Zeus.

- Sabe o que é? Sábado eu vou estar viajando COM O MEU NAMORADO, não posso.
- Então eu ligo na quarta-feira que vem, você me busca na estação e vamos até a sua casa, resolvido.
- Olha, eu não posso fazer isso. Eu estudo muito a semana inteira, meu tempo é todo cheio, e MORO COM MEU NAMORADO, não sei se ele vai estar de acordo com isso.
- Ele mora no mesmo lugar que você?
- Sim.
- E ele é francês?
- Sim.
- Então por que ele não faz um filho com você pra você poder ficar?
- Porque, sabe, eu vou voltar para o Brasil logo, eu quero ir embora, não vou mais ficar aqui, eu não gosto daqui. Aliás, se você me ligar e eu não atender, é porque voltei para o Brasil, ok? E se eu for para o Brasil é porque nunca mais volto na França, já decidi.
- Não volta para o Brasil, não! Não faz essa besteira! Fica aqui e faz um filho, pensa nisso.

Eu já estava a ponto de sair correndo e me esconder em algum canto. Mas, nesse momento, a porta da associação se abre e me chamam para eu ser atendida. Ufa, né? Penso que paguei minha parcela diária de pecados. Raté! Dez minutos depois, quando eu saio da sala onde eu estava, a criatura me esperava:

- Não esquece que eu vou ligar pra você. Não tem problema se você for viajar, eu ligo sempre até você voltar. Aí vamos nos encontrar e eu vou na sua casa.

Ai, Zeus, me castiga mais, vai!

8 Comments:

  • At 8:57 PM, Blogger Rosana said…

    credo dany, que cara mais louco!!!

    :***

     
  • At 10:39 PM, Blogger Unknown said…

    genteeeeeeeeeeeee!Dani, o Toff ficava rindo de mim porque andava apressada entre aquelas ruelas da cidade onde ele mora. ele dizia que ali não era o Brasil, tipo, que ali não tinha com o que se preocupar....mas psicopata tem em qualquer lugar!!!fico imaginando a tua cara entre a vontade de rir e o desespero em se livrar dele. credooooooooooooo! que absurdo!

     
  • At 4:26 AM, Blogger Christophe Marchal said…

    E depois eles nao entendem porque eles tem problema na fronteira ... mas com um comportamento desse parece logico. E depois prejudica todo mundo :$ Mas espero que se chego na estacao de trem o Flo e tu virao me pegar para ir na casa de voces ;-) Beijos e um otimo dia pra voces

     
  • At 6:40 AM, Blogger Monica said…

    Que isso! Gente doida. Gente doida. Não me canso de repetir.

    E pior: eles SABEM que a gente está detestando, SABEM que a gente não vai cortar de uma maneira grossa e ainda assim continuam. Odeio esse tipo de atitude. Se aproveitam da boa educação dos outros. E a gente acaba ficando sem reação, paralisada frente a tanta falta de noção.
    Beijos e boa sorte! Pé de pato, mangalô, três vezes!

     
  • At 10:44 AM, Blogger Julia Franco Gomes said…

    Minha prima, vc não passou o numero correto d'acord?né? helloooooo KKK

     
  • At 3:25 PM, Blogger RodOgrO said…

    hahahahah! Dany, só com vc mesmo! Foi o mesmo que te chamou de baranga da outra vez, será??? Não te falei que ele tava mentindo?

    Jujuba, pior é que tenho certeza que, no pânico, ela passou sim...

     
  • At 9:15 AM, Anonymous Anônimo said…

    Caramba! Tudo isso mais fome, chuva e saco cheio cumulativo. Djisãs.

     
  • At 4:45 AM, Anonymous Anônimo said…

    o que houve com o bom e velho "daí qualquer hora a gente se encontra e toma um café" porque diabos o cara tinha que ir na tua casa??

     

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