Ma vie en rose

De frente, de lado, de costas. En France.


domingo, abril 29, 2007

Drenagem linfática

Ela me observa enquanto eu saio do banho, me seco e escolho uma roupa. Quando resolvo encará-la, faz de conta que não está olhando. Mas sei que em um minuto já contabilizou o número de estrias, pneus e defeitos do meu corpo. Não falo nada, espero o veredicto. E conto os segundos nos dedos: “Um, dois, três, quatro...”

- Tua bunda não tem celulite, mas está bem flácida. Nossa, que bunda bem mole!
- Hum...
- E tua cintura é alta, então, se acumula gordura nos quadris. Uma pena!
- Uhum.
- Tu não estás assim gorda gooooooorda, mas já estiveste muito mais magra, sabias?
- Ahhhh...
- É que, pra uma guria da tua idade, tu estás mesmo muito flácida: os braços, as coxas, a barriga, tudo. Tens que te cuidar mais.
- Terminaste, mãe? Ou tem mais alguma anomalia em mim? Vai ver que é genético... (hehehe: vingança)
- Só estou falando para o teu bem, minha filha. Na verdade, acho que massagens ou drenagem linfática resolveriam. Dizem que esse método é bem eficaz...
- Ô mãe, se é tão bom assim, por que tu não fazes?
- Porque eu já não tenho mais idade para isso, nem interesse. E não tenho mais marido.
- Mãe, a conversa acaba se eu disser que eu também não tenho interesse? Aliás, meu namorado está do outro lado do mundo...
- Ai, Daniella, como tu és dramática.
- Ai, Sônia, vai ver que isso também é genético.
- Quando eu me casei, eu tinha a tua idade. Pesava 45 quilos. Tinha um corpo lindo.
- Ah, então não tem problema. Casar não faz parte dos meus interesses. Resolvida a questão.
- E quais são os teus interesses?
- Ah, mãe, não começa, por favor!
- Minha filha, pensa bem no meu conselho. Uma sessão não é muito cara, R$ 40, R$ 50. Em alguns meses, teu corpo estaria bem melhor.
- Quê? Cinqüenta reais? Mas bem capaz que eu vou gastar dinheiro com isso. Prefiro gastar com livros, cds, dvds. Isso sim me interessa.

Aponta para a minha estante.

- Dá pra ver que te interessa. Aliás, com tudo isso tu poderias ter feito vários anos de sessões de drenagem linfática, massagens, plásticas e até mudança de face!

Minha mãe no primeiro dia de visita dela à minha casa.

segunda-feira, abril 16, 2007

Da série: o que fazer em caso de incêndio

Aí a gente está em uma entrevista muito séria sobre o novo software de gerenciamento de informações de um hospital, com o chefe da área de informática e... plop! O botão da camisa - sim, aquele que fica bem entre os peitos - resolve se manifestar e abrir, deixando à mostra o que nem a lingerie consegue esconder.
O entrevistado se engasga, perde o fio do discurso, e paralisa os olhos bem no buraco que eu estou tentando esconder, disfarçadamente, e em vão. “Do que eu estava falando mesmo?”, ele me pergunta fazendo de conta que não está percebendo que eu tento retorcidamente, por detrás do bloco de anotações, colocar o maldito botão de volta na sua casinha. “Hummm é... sobre...”. Na verdade, nem eu lembro, porque meu cérebro mandou todo o sangue da cabeça para as bochechas. Com aquele sorrisinho amarelo, entôo a famosa perguntinha: “Senhor fulaninho, qual é o objetivo deste novo sistema?”. E aí a criatura desanda a falar, vermelho como um tomate, fazendo de conta que não está vendo, mas está vendo que eu sei, minha segunda desajeitada tentativa de fechar a blusa com a mão esquerda, enquanto a direita desanda a anotar as informações.
Ele pára, olhos fixos na minha mão. Eu tento tapar o buraco com a palma aberta, sem olhar que ele está olhando, mas percebendo. Hum, qual era aquela outra pergunta de emergência mesmo? “Até quando o senhor acha que o hospital vai estar operando dentro de todo o sistema?”. Largo a caneta na mesa e estou indo descaradamente abotoar a camisa quando ele, pára no meio da resposta e pergunta se eu não vou anotar. “Na verdade, só anoto como medida de segurança porque o gravador registra tudo” – e me vem à mente a cena de dias atrás quando o aparelho resolveu engolir a fita inteira na frente do diretor-geral do mesmo hospital. “Ah” – os olhos persistem nos movimentos das minhas mãos. “Mas o senhor estava falando sobre o tempo de adaptação ao sistema, não é?”. Caraca, estou ficando boa nisso! Agora eu penso, anoto, pergunto e abotôo a blusa ao mesmo tempo. Ele olha para o lado, eu olho para baixo. O botão está quase dentro da casinha, a blusa quase fechada. Ele volta os olhos para mim, respira fundo. Eu sorrio, ele sorri de volta. Ele pensa: “Mazá, tu conseguiu, guria!” e eu penso: “Viu só, sou muito boa e abotoar camisas em entrevistas superimportantes e acabar com situações constrangedoras!”.
Em vão. Quando me levanto e estendo a mão para me despedir, a blusa abre novamente. Ouço a risadinha maléfica do botão: “Hihihihihi! Se fudeu, se fudeu!”. Ok, respirar fundo, postura, e lembrar que só estou na frente do entrevistado com os peitos quase de fora. Lembro da máxima que sou uma princesa, porque eu sou uma princesa, pego minha bolsa e a atravesso bem na frente da abertura. “Muito obrigada e até nunca mais”, I hope so. Antes de chegar à porta de saída, coloco o botãozinho com toda a vontade dentro da casinha. Ah, como é bom a liberdade de colocar os botões dentro das casinhas! Um passo a frente, e a bolinha sai rolando saltitante e alegre pelo chão. Ok, você venceu, botão.
O que fazer em caso de incêndio? Com a pasta do estilo “meu primeiro sutiã”, saio, correndo, em busca do banheiro. Um espelho enorme me espera para me contar o tamanho do desastre. Chego devagarinho, pé ante pé, para o susto não ser maior do que o fato. “Te acalma, Maria do Bairro!”.
Na frente da imagem, a decepção. Em pé, com meus 1,65m completamente à mostra, não enxergo nada, nada, nada demais: só de menos. Gostaria mesmo que houvesse alguma coisa para ser olhada ali...